Assim como muitos sistemas jurídicos de tradição civilista ao redor do mundo, as legislações brasileira e mexicana possuem profundas raízes no Direito Romano, particularmente em áreas como contratos, direitos de propriedade e obrigações. Essa base comum ajuda a explicar a semelhança entre as normas que regulam locações em ambos os países.

Por ser um tema recorrente em minha prática profissional, tive a oportunidade de estudar as leis que regulam as locações no México, com foco especial na Cidade do México, e, a seguir, explorarei alguns pontos que diferenciam as regulamentações de locações entre o Brasil e a Cidade do México.

Sistema Legislativo

No Brasil, as locações são regidas unicamente por legislação federal. Isso se deve ao nosso sistema de repartição de competências, que permite ao governo federal adotar uma posição centralizadora para regulação deste tema, com o objetivo de garantir a uniformidade nas políticas habitacionais do país. A lei federal 8245/1991 é voltada unicamente para locação de imóveis urbanos, enquanto os outros tipos de locações, como de bens móveis e rurais, são regidos por outras normativas também de alcance nacional.

Por outro lado, no México, as entidades federativas – como a Cidade do México, que é considerado um Distrito Federal – têm um nível maior de autonomia para criar leis específicas de habitação, desde que estas não conflitem com a constituição federal ou com outras leis federais. E assim é: as condições mais gerais das locações urbanas na Cidade do México estão previstas no Código Civil da Cidade do México – DF, e algumas condições – mais específicas – na Lei de Moradia da Cidade do México. A legislação federal mexicana, nesse contexto, se limita a aspectos sociais da habitação, com enfoque em assegurar à população o direito constitucional à moradia.

Prazo

Uma diferença importante entre as legislações brasileira e mexicana está no prazo locatício.

Na Cidade do México, o Código Civil estabelece que o prazo mínimo de locações residenciais é de um ano, podendo ser prorrogado pelo locatário por um ano adicional, desde que não haja disposição contratual em contrário, e que o pagamento dos aluguéis esteja em dia. Já para as locações destinadas ao comércio ou a indústria, o prazo não pode exceder 20 anos.

No Brasil, não há prazo locatício mínimo ou máximo, mas tão somente condições específicas para locações com prazo inferior ou superior a 30 meses.

Além disso, na Cidade do México, em contratos com prazo locatício superior a 3 anos, o locatário adimplente tem o direito de ser preferido em caso de nova locação do imóvel, em condições de igualdade com outros interessados. No Brasil, a renovação da locação apenas é garantida para locações destinadas ao comércio e sob requisitos específicos (como prazo mínimo de 5 anos, desempenho da mesma atividade no local, etc.).

Término e Rescisão da Locação

Outra distinção relevante é a impossibilidade, na Cidade do México, de rescindir imotivadamente o contrato antes do término do prazo locatício, regra que se aplica tanto ao locador quanto ao locatário. No Brasil, o locatário tem a prerrogativa de rescindir o contrato, de forma unilateral e a qualquer momento após celebrado, desde que arque com a penalidade cabível, que, nas locações típicas, é proporcional ao prazo remanescente da locação.

Com isso, podemos concluir que, na Cidade do México, a “denúncia vazia” do locatário (rescisão injustificada e unilateral da locação antes do término do prazo locatício), poderia obrigá-lo arcar com todo o saldo do contrato de locação, em uma estrutura que se assemelharia à penalidade por rescisão antecipada em contratos build-to-suit no Brasil.

A legislação da Cidade do México também é mais abrangente do que a legislação brasileira no que diz respeito às hipóteses de término da locação, sendo previsto, por exemplo, que a locação pode ser encerrada em caso de perda ou destruição total do imóvel por motivo de caso fortuito ou força maior, em caso de expropriação e de evicção. Essas são hipóteses não estão previstas na lei de locações brasileira, muito embora sejam amplamente discutidas e previstas nos contratos entre partes sofisticadas.

Valor do Aluguel

Na Cidade do México, os contratos de locação devem, em regra, ser firmados em pesos mexicanos, conforme estipulado pela legislação local. Contudo, em contratos comerciais ou de alto valor, as partes podem acordar o uso de moeda estrangeira, como o dólar. Essa alternativa abre uma possibilidade muito interessante para players estrangeiros que desejam alugar imóveis no México, mas não querem estar expostos à variação cambial. Em contraposição, no Brasil, o real é a única moeda legalmente aceita para pagamentos.

Além disso, uma alteração recente e importante na Cidade do México, foi a imposição de um limite para o reajuste anual das locações residenciais de longo prazo, limitando-o à inflação do ano anterior. No Brasil, por outro lado, é comum, mas não mandatório, que os reajustes anuais sejam baseados em índices de inflação, como o IGP-M ou IPCA, inexistindo, no entanto, um limite estabelecido para o percentual de reajuste.

Direito de Preferência

O direito de preferência para a compra do imóvel locado é outro ponto de distinção. Na legislação da Cidade do México, duas condições são expressamente previstas: (i) o locatário só pode exercer o direito de preferência se estiver adimplente; e (ii) caso sejam alteradas as condições da oferta inicial (exceto em relação ao preço, salvo se a variação for superior a 10%), o locatário terá um novo prazo de 30 dias para exercer a preferência. No Brasil, o direito de preferência é previsto na Lei de Locações, mas não inclui disposições tão específicas.

As diferenças destacadas entre a legislação brasileira e a mexicana demonstram a necessidade de uma análise jurídica minuciosa para quem pretende atuar no mercado imobiliário de ambos os países. No Brasil, a legislação oferece maior flexibilidade para negociar prazos e condições de locação, proporcionando mais autonomia às partes contratantes. Em contrapartida, no México, há uma tendência a um regime mais protetivo em relação ao locatário, podendo ainda existir uma variação relevante do regime legal em função do local onde está localizada a propriedade locada.

Essa distinção reflete não apenas as particularidades culturais e socioeconômicas de cada país, mas também diferentes abordagens políticas em relação à moradia e à proteção social. Estar ciente das especificidades locais de cada legislação pode evitar litígios, otimizar negociações e garantir maior estabilidade nas relações locatícias, permitindo que sejam tomadas decisões mais estratégicas e adequadas a cada jurisdição.

Por: Gabriela Pacela